Uma definição prática de codependência
Se eu tivesse que resumir a codependência emocional em uma palavra, seria REATIVIDADE. A pessoa codependente não tem uma vida ATIVA em que faz o que quer, mas vive REAGINDO a outra pessoa.
Na prática, a codependência é priorizar as necessidades, expectativas ou problemas dos outros ao invés da sua própria saúde mental e física. Na codependência, o senso de valor de uma pessoa vem dos outros e não si mesma.
A pessoa codependente se relaciona como se dissesse através de suas atitudes a seguinte frase: “EU PRECISO QUE VOCÊ PRECISE DE MIM.”
Sem senso de valor
Pessoas codependentes não enxergam seu próprio valor, por isso precisam que outras pessoas provem seu valor. Em uma pessoa com codependência emocional , o desejo de manter um parceiro romântico ou uma amizade é mais importante do que qualquer outra coisa.
O objetivo da recuperação da codependência é a INTERdependência, onde uma pessoa pode cuidar e nutrir a outra, mas nunca em detrimento pessoal, nunca se sacrificando.
Muitos pacientes meus com codependência, param de se encontrar com seus amigos, de ir à academia, de fazer coisas que gostam, até mesmo de postar nas redes sociais o que querem para agradar a pessoa amada ou cuidar dela. E esse é um sintoma chave da codependência emocional.
Uma personalidade reativa
Tive uma paciente que começou o tratamento para depressão. Ela era vegana por convicção, daquelas que não comem carne por amor aos animais. Estávamos progredindo com o processo terapêutico.
Então ela começou a se relacionar com um homem que fazia churrasco em casa 3 vezes por semana. Adivinha… Ela passou a AMAR churrasco e bater no peito orgulhosamente para dizer que era “carnívora raiz” (uma frase dele que ela repete).
Foi então que ficou claro que a depressão e a ansiedade que ela tinha eram sintomas do verdadeiro problema subjacente: a codependência emocional.
Tentar ficar parecida com a “pessoa amada” é uma forma de controle.
A necessidade de controle da codependência
Esse foco externo leva uma pessoa codependente a querer controlar a outra pessoa no relacionamento. Isso gera um paradoxo: quanto mais alguém se esforça pra controlar outra pessoa, mais descontrolado se sente, porque nenhuma pessoa pode realmente mudar a outra.
Por isso a primeira estratégia é mudar a si mesma para depois usar isso para tentar mudar o outro. É como se ela inconscientemente dissesse “Eu mudei por sua causa. Agora é sua vez de mudar por minha causa.” Obviamente isso não funciona. Esse paradoxo leva a pessoa com codependência a se sentir impotente e vitimizada.
Codependência é um modelo de mundo
A codependência é uma experiência generalizada; é uma lente através da qual se vê todas as pessoas em sua vida, não só pessoas amadas ou com quem se relacionem.
Na codependência, a experiência emocional é quase sempre infantilizada, sem experimentar toda a gama de sentimentos humanos, mas experimentando somente as mesmas emoções:
- Medo/Ansiedade = “Não estou seguro(a)”
- Ressentimento = “Você tinha que ser do jeito que eu quero.”
- Culpa = “Não posso dizer ‘NÃO’ senão serei uma pessoa ruim.”
- Vergonha = “Não tenho valor”, “Não sou uma pessoa que vale a pena”, “Não mereço o amor”
E isso não acontece somente dentro dos relacionamentos. As pessoas com codependência têm esse transtorno o tempo todo. Se sentem assim até quando vão à padaria. Está sempre dentro delas.
Na codependência sempre há desequilíbro
Os relacionamentos de codependência são desequilibrados por sua própria natureza. Geralmente há alguém que dá além do que é apropriado, razoável ou honesto, se sacrificando e se descuidando, enquanto a outra pessoa recebe esse excesso sem dar um limite nem perceber o exagero.
As duas pessoas envolvidas são doentes, mas a maioria das que procuram terapia são as que se doam demais para provar seu valor. Quase sempre o outro, que se aproveita, é narcisista ou tem traços narcísicos fortes, ainda assim, raramente, procuram ajuda.
Aqui vou me concentrar no caminho de recuperação daqueles que são mais passivos e generosos.
Os sintomas clássicos da codependência
Pela minha experiência clínica, corroborada pela literatura disponível sobre o assunto, existem 5 sintomas fundamentais da codependência facilmente verificáveis:
1 – A Necessidade de Agradar os Outros
A pessoa codependente prioriza a aprovação e o desejo dos outros sobre o que quer ou precisa, e pode nem saber o que quer ou precisa. Alguns comportamentos que demonstram isso. A pessoa:
- Acredita que é egoísta focar em si mesma
- Sente culpa quando diz não
- Sente ressentimento quando as pessoas não apreciam tudo o que ela faz por elas (mesmo quando não pediram nada do que foi feito)
- Quer evitar todos os conflitos, mesmo que isso signifique abrir mão do que é importante pra ela. viver sua vida
- Se sentir refém das expectativas dos outros
- Acredita que suas emoções ou necessidades são um fardo para os outros
- Lutar pra se concentrar em seus próprios problemas
- Acha que tem que viver de acordo com os padrões de outra pessoa e não com os seus próprios
2 – Falta de senso de valor próprio
A pessoa com codependência tem a sensação de que não sabe quem realmente é ou que se perdeu de si mesmo.
Ela se considera em termos dos papéis que desempenha para os outros, não pelo que é como pessoa. A pessoa pode:
- Fixar seu valor no julgamento dos outros
- Se esforçar para provar seu valor
- Desacreditar as próprias realizações pessoais, achando que não têm valor
- Completar metas, mas criar metas mais difíceis em vez de aproveitar a conquista
- Estar disposta a mudar de interesses dependendo de com quem passa o tempo
- Sentir que se perdeu ou nunca soube quem realmente era
- Ter o desejo de morrer, desaparecer ou não existir
3 – Descolamento da realidade
A codependência faz a pessoa lutar com sua perspectiva individual sobre o mundo e ter dificuldade em esclarecer seus pensamentos, sentimentos, necessidades e senso de si mesmo. A pessoa pode:
- Aceitar a versão dos outros sobre a sua própria realidade
- Sentir-se mal, doente ou errada ao questionar os outros
- Dissociar-se da realidade, às vezes se entorpecendo com álcool, drogas, pornografia, comida, compras excessivas ou trabalho
- Minimizar o impacto das coisas ruins que acontecem com ela
- Ter dificuldade em entender como se sente em relação aos eventos de sua própria vida
4 – Pensamento distorcido
A codependência pode levar à tendência a ter pensamentos generalizados e negativos sobre si mesmo, os outros e o mundo. A pessoa codependente pode:
- Acreditar que não é certo ou seguro compartilhar o que realmente pensa ou sente
- Levar o comportamento dos outros para o lado pessoal
- Tentar ser perfeita em tudo (perfeccionismo)
- Ter uma mentalidade de “tudo ou nada”
- Se preocupar obsessivamente e nunca conseguir parar de pensar
- Estar convencida de que sabe como as outras pessoas realmente devem ser
- Não aceitar os outros por quem eles realmente são
- Ter pensamento mágico, a ideia de que, se a outra pessoa mudasse, tudo na vida seria perfeito
5 – Problemas com intimidade
A codependência leva a pessoa a lutar para manter relacionamentos acima de qualquer coisa, se sentir sobrecarregada quando os outros querem conhecê-la ou muitas vezes se sentir invisível para os outros. A pessoa pode:
- Ter a sensação de querer desesperadamente ser um com alguém
- Transformar outra pessoa em seu deus ou oxigênio
- Reprimir sentimentos até explodir e se sentir justificada por ter ficado quieta por tanto tempo
- Sentir-se abandonada quando os outros colocam limites
- Permitir que outros dominem conversas e planos para que a pessoa possa se esconder atrás deles
Uma visão geral da codependência
Procurei ser o mais conciso, na medida do possível, na descrição dos sintomas práticos comportamentais da codependência. Em outro artigo, vou descrever as causas e como se libertar.
M
Os livros da Melody Beattie são ótimos. Descobri porque faço parte de uma irmandade de mulheres há 4 anos. Os sintomas da codependência se misturam com o “amar demais.” É horrível. Só por hoje…
Sucesso!
São muito bons, tanto o primeiro, que criou a definição mais ampla de codependência, quanto o último que atualizou o conceito mais ainda. Mas é fato que funciona como um vício e ter um grupo de apoio ajuda demais. Parabéns!